
Eu me aceito como ser imperfeito, reconheço minhas limitações. Como sou propício à raiva, me programei para sentir raiva de ter raiva, portanto evito situações que venham a brotar essa emoção. Essa proteção vai de comprar produtos de qualidade confiável a evitar certos eventos a fim de não encontrar determinadas pessoas. Perdi
algumas oportunidades que poderiam ter sido maravilhosas para não ver alguns seres humanos que não me apetecem. Minha paz vale mais. Não gosto de arriscar.
Citei em outro texto que voltei a nadar, professor excelente, estava indo tudo bem. Eis que me deparo com um antigo colega de trabalho, não qualquer um, mas o pior que já tive. De todas as atribuições do cargo, ele conseguia ser péssimo em todas, inclusive se ressalta algumas características dele: babão, sovina, chato, desafinado, medroso e com piadas de gosto questionável (e eu adoro piada sem graça, mas ele estava num patamar além!). Ainda bem que ele passou em outro concurso. A gente tem que desejar que nossos desafetos estejam bem, gente de bem com a vida não enche o saco alheio, portanto fiquei feliz, teria menos possibilidade de o ver, afinal foi um cargo federal, possivelmente demoraria muito para ele ser transferido para cá. Há uns meses, infelizmente, soube que ele conseguiu transferência para Fortaleza. Constatei essa informação ao me encontrar com ele, eu na piscina, treino bom, eis que vou perguntar ao professor qual seria o próximo exercício, vejo o desgraçado sentado com sua filha. Soube que ele levava a menina no segundo horário, passei a participar de outra turma a fim de evitar qualquer proximidade.
Nesse dia, pelo menos saí sem ser visto, acho, pois ele não falou comigo. Algumas vezes perguntei aos instrutores da academia o horário do antigo colega levar a filha. Um riu quando expliquei o porquê, já o professor de natação me olhou com uma expressão confusa, fiquei envergonhado, não perguntei mais. Talvez ele não tenha falado comigo por causa da vez em que eu ignorei na rua: eu estava passeando com minha cachorra, ele me cumprimentou em voz alta, fingi não ouvir (o bom de andar de fone é poder culpar o dispositivo eletrônico). Dias depois, uma vizinha me perguntou se eu não o vira.
- Vi sim, fingi que não. Não gosto dele. – respondi sem titubear – É um lixo – emendei.
- Ah... – a vizinha ficou desconcertada com a sinceridade, sua verborragia foi contida, terminou o diálogo.
Minha paz durou uns meses, treinos legais, sem qualquer mal-estar. Até que recentemente eu o vi, novamente acompanhava a filha que iria participar da aula vindoura, todo o bem-estar dos metros aquáticos percorridos se esvaiu, logo um calor colérico me aqueceu de forma desagradável. Não sei se por ser fã do Batman ou por ser ansioso (talvez todo fã do Batman seja um ansioso), comecei a imaginar cenários de como agir, como passar despercebido por ele, caso ele me visse como reagir, o que falar, o que fazer; braçadas, pernadas e pensamentos dignos de um enxadrista. A menina participaria da aula seguinte da minha. Saí da piscina, não tirei a touca nem os óculos, corri para o banheiro, durante o banho calculei forma de não ser visto, queria ter levado um boné. Abri a porta do banheiro devagar, pisei de mansinho e acelerado, me imaginei invisível, tentei esconder o rosto com o ombro tal uma esquiva de boxe. Não ouvi a voz dele. Sucesso.
Um dos cenários mentais projetados era de partir para confusão se ele viesse tentar conversar. Sim, esse é o nível de carinho que nutro por ele. A imagem da filha dele em seu colo me sensibilizou, pensei “até os babacas podem ser pessoas boas para alguém.” E podem ter certeza de que o inverso se aplica.
Não sei como serão os dias seguintes, me esforçarei para evitar o embate, pois tenho outro grande princípio que rege minha conduta: preguiça. Sobre isso escreverei outro texto.
Ah, o professor me disse o horário em que o colega leva a filha para natação, hehehe
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